» Matar para Viver «

Alan wake

Alan Wake

 
O medo está, independentemente da nossa vontade, entranhado na vida. Que tolos éramos quando, na nossa infância, dizíamos a quem nos quisesse ouvir que não tínhamos medo de nada. Todos temos medo de alguma coisa. Alguns são apenas fobias simples explicadas pela psicopatologia, como o medo do escuro, o medo de insectos, o medo de alturas. Depois existem os outros medos, aqueles que estão lá e não se manifestam no dia-a-dia, silenciosos, medos nos quais não pensamos e que enfrentamos em situações específicas – o medo de perder alguém de quem gostamos, o medo de ter uma má nota no exame quando não estudámos o suficiente, os medos a que preferimos chamar receios ou preocupações.

"Os pesadelos existem fora da lógica, e não há diversão nenhuma nas explicações; elas são antitéticas à poesia do medo." É com esta frase de Stephen King que começa Alan Wake, e é com ela presente na memória que Alan Wake se joga.


 
O mais recente título da Remedy Entertainment pode, contudo, não ser aquilo que os fãs esperavam. A nível pessoal, o que a início me pareceu um jogo secante e aborrecido, rapidamente se tornou numa viagem viciante, gratificante e emocionalmente complexa. Não será, talvez, um jogo para aqueles que veneraram Max Payne, mas é, sem sombra de dúvida, uma experiência recomendada a todos os amantes de thrillers psicológicos que oferecem mais perguntas que respostas.

Alan Wake é um escritor nova-iorquino que, depois de uma mão cheia de obras de sucesso, não consegue fazer com que a escrita lhe flua para um próximo livro. Depois de dois anos neste bloqueio criativo, a sua mulher, Alice, resolve levá-lo numa viagem até Bright Falls, a pequena cidade tipicamente norte-americana cheia de boas pessoas e simpatia.

Como thriller psicológico que é, o jogo rapidamente se torna numa luta pela sobrevivência e na procura pela saída daquilo que mais parece ser um pesadelo, com Wake em busca da sua mulher, que desapareceu misteriosamente assim que se instalaram na casa do lago.


 
O jogo que a Remedy lançou hoje, na Europa, mais parece uma mistura interactiva entre um livro e uma mini-série de televisão, não por uma cinematografia ou gráficos de qualidade excepcionalmente elevada, mas pela sua própria organização. Alan Wake está dividido em seis episódios; todos eles acabam em suspense, onde o cliffhanger é excelentemente complementado por um plano negro que encerra o capítulo. No início de cada um existe, ainda, um resumo do que aconteceu até aí, que serve como uma linha orientadora para o jogador.

Curiosamente, este sistema resulta bastante bem, passando uma sensação de satisfação agridoce, devida, em parte, à boa escolha da música aplicada no final de cada episódio. Se a Remedy soube aplicar boa música nestes momentos, certamente também soube fazer um bom trabalho sonoro durante todo o jogo. O ambiente negro é apoiado pela típica música perturbante, digna de um qualquer filme de Hitchcock. O som dos disparos transmite o impacto que se pedia, e toda a manifestação sonora da Dark Presence está bem trabalhada.


 
Não avançando demasiados detalhes, esta "Presença Negra" é, no fundo, aquilo que o jogador irá conhecer imediatamente e que se afirmará como parte integrante do objectivo do jogo. Todos os obstáculos com que Wake se depara são controlados por ela, que variam entre habitantes da região, pássaros possuídos, máquinas agrícolas desgovernadas ou carros que voam como se de brinquedos se tratasse.

Qual a explicação para estes fenómenos paranormais? Basta recordar a frase de Stephen King. A verdade é que, em Bright Falls, Alan começa a encontrar páginas soltas do seu novo livro, uma obra que não se recorda de ter escrito. O que é descrito nas páginas acontece nesta estranha realidade, oferecendo a hipótese, ao jogador, de saber o que vai acontecer num futuro próximo. Este conhecimento não nos facilita, contudo, a vida, oferecendo quase um medo duplo: o medo do acontecimento em si, e o medo criado por desconhecermos o momento em que irá acontecer aquilo que lemos.


 
Não se pense, ainda assim, que Alan Wake é um jogo de terror. É, sim, um jogo psicológico, que retrata a busca incansável do protagonista pela mulher que ama. Para o ajudar na demanda, Alan terá ao seu dispor uma mão cheia de armas. É certo que não é um leque extenso, mas, francamente, não são precisas mais no tipo de jogo que é.

As armas só resultarão quando aliadas à lanterna, que será quase mais importante que o revólver ou que a espingarda, pois é esta que permite "extrair" a escuridão de todos os inimigos que se nos apresentam. Existem outras fontes de iluminação às quais o jogador quererá deitar a mão o mais depressa possível, como granadas de atordoamento (flashbangs) ou pistolas de sinalização (flare guns). Aqui, lutar o mal com a luz é uma expressão literal.

A jogabilidade é simples, mas resulta. Na mão esquerda, Alan levará a lanterna; na direita, transportará a arma. Os controlos são intuitivos, embora os movimentos da personagem estejam limitados a poucas acções. A câmara pode oferecer alguns problemas, especialmente porque nos obriga a rodá-la constantemente - nada a que não estejamos habituados ao fim de umas horas com o comando na mão.


 
Alan Wake não é um jogo magnificamente bem detalhado, contando com algumas arestas que podiam ser limadas e expressões faciais que mereciam estar bastante melhores. No entanto, embora não possam ser ignorados, estes erros são compensados pela excelente iluminação que a equipa criou. As luzes estão do mais real que se tem visto, adaptando-se ao cenário e às superfícies onde embate, especialmente a luz da dita lanterna que Alan transporta pela noite dentro.

Pelo caminho iremos encontrar rádios ou televisões espalhadas, em casas ou torres de vigia, que, juntamente com as páginas do livro, nos ajudarão a perceber melhor a história. Das restantes personagens, é quase obrigatório referir Barry Wheeler, o agente de Wake, que é capaz de ser uma das mais carismáticas da aventura.

No fundo, Alan Wake é um bom jogo para quem gosta de mistérios e de uma fantasia negra. Não é uma obra prima, tecnologicamente falando, mas é um título adulto e uma experiência única dentro da Xbox 360. Sobre o final, e por respeito à Remedy, digamos apenas que nos provoca um arrepio na pele

Pesquisar no site

© 2011 Todos os direitos reservados.